O início

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As escolas de samba são uma daquelas páginas incríveis que a festa momesca soteropolitana acumula nos seus mais de cem anos de história. Certamente, este momento se consolidou como uma das fases de maior beleza estética que a festa já presenciou.

Escola de Samba Diplomatas de Amaralina (1975)

O final da década de 1950 foi o cenário embrionário para essas entidades. O carnaval de rua de Salvador, neste momento, já estava consolidado como essencialmente popular – com a presença de cordões, blocos, batucadas, afoxés, pequenos e grandes clubes e do próprio trio elétrico.

Neste período, no Rio de Janeiro, o carnaval já era marcado pela presença e exuberância das escolas de samba. Com o advento da comunicação midiática, o sucesso de seus desfiles passou a ser conhecido e admirado em todo território nacional. E, obviamente, os carnavalescos soteropolitanos estavam de olho em tudo isso. Acompanhando pelo rádio e pelos jornais o crescimento vertiginoso das agremiações cariocas, muitos grupos que participavam diretamente do carnaval de Salvador, especialmente, com cordões e batucadas, começam a cogitar a transmutação das suas entidades para a categoria de escolas de samba. Outro importante fator a que se atribui essa influência são os soteropolitanos que iam ao Rio de Janeiro e retornavam a capital baiana trazendo novidades que inspiravam movimentos por aqui. Os exemplos mais citados, no caso das escolas de samba, são os marinheiros e os fuzileiros navais que serviam na capital carioca.

“As idas e vindas ao Rio de Janeiro fez com que sentíssemos aquele frisson pelas escolas de samba.” [Nelson Rufino, em entrevista para este projeto]

Alguns pesquisadores defendem que a transformação se deu basicamente da batucada para a escola de samba. Entretanto, a pesquisa documental com arquivos da imprensa da época mostrou que, não apenas as batucadas modificam-se para integrar a categoria de escola de samba, mas muitos cordões também o fazem. Obviamente que as batucadas, por já terem uma bateria estabelecida e uma relação exclusiva com o samba possuem um contexto mais propício para essa mudança. Porém, independente do histórico da agremiação, para ser considerada escola de samba todas precisaram potencializar sua bateria, pesando ainda mais sua percussão, com a inclusão de instrumentos como tarol, surdos e repiques. Ainda, precisaram adequar-se e dividir a entidade por alas, não esquecendo da obrigatoriedade de se ter um samba-enredo para cada carnaval. Ou seja, muitas e desafiadoras mudanças foram necessárias para consumar de fato essa alteração de categoria e, por isso mesmo, muitas entidades não conseguiram alcançar a condição de escola de samba.

Escola de Samba Diplomatas de Amaralina (1974)

A PIONEIRA

É no ano de 1957 que a Bahia vê nascer a sua primeira escola de samba, a Ritmistas do Samba. Criada por Washington da Preguiça, a entidade era formada por dissidentes da batucada Nega Maluca, do bairro da Preguiça. A partir desse fato, dezenas de novas escolas surgem oriundas de diferentes bairros da capital. Das pioneiras, duas confirmam, inclusive, a sua origem nos cordões carnavalescos soteropolitanos – é o caso da E.S. Juventude do Garcia, fundada em 1959, a partir do antigo cordão Filhos do Garcia; e da E.S. Filhos do Tororó, fundada em 1963, conhecida até então como Cordão Carnavalesco Filhos do Tororó.

Apesar de os relatos confirmarem que a Ritmistas do Samba foi fundada em 1957, na imprensa ela só aparece dessa forma em 1960. [Diário de Notícias, 10 e 11/01/1961]

Apesar de os relatos confirmarem que a Ritmistas do Samba foi fundada em 1957, na imprensa ela só aparece dessa forma em 1960. (Diário de Notícias, 10 e 11/01/1961)

A década de 1960 assiste o nascimento de inúmeras escolas de samba, que diversificam e modificam, mais uma vez, o cenário da festa carnavalesca soteropolitana. De 1957 até a segunda metade da década de 1970, identificou-se o número surpreendente de 50 escolas de samba citadas pela imprensa baiana. Obviamente que destas pouco mais de uma dezena chegaram a alcançar a estrutura que se exigia de uma escola de samba – foram, certamente, as que mais se destacaram nos concursos oficiais.

O surgimento das escolas era, quase que exclusivamente, vinculada ao território que seus criadores e participantes ocupavam na cidade. Essa característica é refletida, inclusive, nos nomes de muitas delas – como é o caso da Filhos do Nordeste, Filhos da Liberdade, Filhos de Luis Anselmo, Juventude da Cidade Nova, Juventude da Boa Viagem, entre tantas outras. Essa territorialidade está presente de forma muito constante em toda extensão temporal do carnaval de Salvador e é esse elemento que consagra alguns bairros como redutos da festa e do samba, como foi o caso, certamente, do Tororó, do Garcia e da região da Ladeira da Preguiça.

Esse período consolida-se como um grande momento do carnaval de rua de Salvador. E, mais uma vez, são os negros e mestiços de bairros populares da cidade os grandes protagonistas dessa festa.

No destaque, o mestre sala e a porta bandeira da Escola de Samba Filhos do Tororó, no carnaval de 1969. [Diário de Notícias, 20 fev. 1969]

E.S. Filhos do Tororó (Diário de Notícias, 20 fev. 1969)

“As Batucadas transformam-se em Escolas de Samba, revelando tanto o seu crescimento quanto o alargamento espacial da festa. Enfim, uma Escola de Samba seria uma representação afro-carnavalesca que se flexibilizaria ao sabor do crescimento do Carnaval, e a construção da “bateria pesada” carioca revela que seus instrumentos deveriam repercutir em dimensões de maior espaço e população.”
[Antônio Godi]